O resíduo do resíduo tem serventia

Cinzas do bagaço de cana-de-açúcar geram novos produtos

O Brasil é um destacado produtor de etanol derivado da cana-de-açúcar – cerca de 27 bilhões de litros de etanol por ano. O bagaço que sobra no processo de fabricação é, quase todo, queimado em caldeiras e o vapor usado para gerar energia elétrica.

E o que se faz com a cinza do bagaço da cana-de-açúcar, cujo volume anual é estimado em quatro milhões de toneladas? Pesquisadores brasileiros estão propondo uma destinação econômica e ambientalmente viável para esses rejeitos. Por exemplo, aproveitá-los como insumo na fabricação de argamassa e concreto para uso na construção civil.

A proposta do pesquisador da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Almir Sales, é substituir 30% a 50% em massa da areia natural pela cinza do bagaço de cana na produção. Segundo o pesquisador, essa mistura não apenas preserva as características físicas e mecânicas de um concreto de boa qualidade, mas também traz benefícios.  “Nessa faixa de substituição, o concreto feito com cinzas pode ter um ganho de resistência 20% superior ao concreto convencional”. Além disso, esse tipo de concreto utilizará menos areia, diminuindo o impacto ambiental nos leitos dos rios, de onde é retirada. O concreto feito com cinzas de bagaço poderá ser empregado na fabricação de guias, sarjetas e bocas de lobo. “Várias prefeituras já trabalham com aplicação de outros resíduos para produção de artefatos de concreto”, ele acrescenta.

As pesquisas do físico Silvio Rainho Teixeira, da Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp), renderam pelo menos três aplicações para o rejeito: a produção de briquetes, de fritas e de vitrocerâmicas (cerâmicas vítreas).


Briquetes

Produto feito de pó de carvão da cinza que é prensado e serve como alternativa ao carvão vegetal comum. Os briquetes apresentam maior densidade e poder calorífico igual ou superior ao do carvão de madeira. Podem ter aplicação industrial ou residencial.


Fritas 

Insumo semelhante a um vidro que se quebra em pedaços muito pequenos e é usado para fazer o acabamento vitrificado de peças cerâmicas como pisos, azulejos e vasos, entre outros.


Vitrocerâmicas

Material produzido a partir da cristalização controlada de materiais vítreos. Panelas e tampas de “vidro” de fogão elétrico são exemplos de utensílios vitrocerâmicos transparentes. As vitrocerâmicas apresentam propriedades importantes, como dureza superior à das pedras naturais, absorção zero de água e menor densidade. Por isso são usadas como revestimento interno e externo de edificações.
Segundo Teixeira, o primeiro passo para a formulação desses novos produtos é a separação da fração orgânica da inorgânica das cinzas do bagaço. Os briquetes são fabricados a partir da porção orgânica, enquanto as fritas e as vitrocerâmicas utilizam a parte inorgânica, que é rica em dióxido de silício (SiO2), matéria-prima dos vidros mais comuns.

Já o engenheiro químico paulista Leonardo Glidiz, pesquisando as cinzas a fim de desenvolver fertilizantes, derrubou o composto na roupa e no chão. “Observei que o composto havia deixado marcas fortes, difíceis de sair”, recorda Glidiz. O material foi para análise e, assim, o negro de fumo orgânico foi inventado. Negro de fumo é um insumo presente em pneus, artigos de borracha, tintas, vernizes e adubo, entre outros produtos.

Essas pesquisas mostram que é possível um reaproveitamento de resíduos significativo e economicamente viável. O que não tem mais utilidade para nós pode servir para alguém, ou então pode ser reciclado, proporcionando a diminuição do uso de recursos naturais, o que é bom para o ambiente e para todos nós.

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