Biocombustíveis: bons ou ruins?

A comunidade científica já está trabalhando em prol dos biocombustíveis de segunda geração. Um edital publicado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) contempla propostas que enfocam o desenvolvimento de novas tecnologias para a sua produção.

A Faculdade de Engenharia Química (FEQ), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), acaba de depositar a patente da tecnologia para a produção de bioquerosene de óleos vegetais que pode tornar o combustível usado em aviões menos poluente e 30% mais barato. Já os pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) trabalham no desenvolvimento de tecnologia para a produção do biocombustível extraído do abacate. Do fruto é possível extrair óleo (da polpa) e álcool etílico (do caroço), o que o torna mais interessante em relação a outras oleaginosas. Outra vantagem é sua produtividade. É possível extrair de 2,2 mil litros a 2,8 mil litros de óleo por hectare do abacate, enquanto se extrai 440 a 550 litros/hectare da soja; 740 a mil litros/hectare da mamona; 720 a 940 litros/hectare do girassol; e 280 a 340 litros/hectare do algodão.

Tudo isso é bom ou ruim? Qual será o impacto social e ambiental da produção dos biocombustíveis no Brasil? Afetará a produção de alimentos? O pesquisador William Laurance, do Instituto Smithsoniano (EUA), afirma que, em termos ambientais, os biocombustíveis não são sempre melhores que os combustíveis fósseis. Laurance chegou a essa conclusão com 12 dos 26 tipos de biocombustíveis já analisados por ele.

Segundo ele, o etanol, por exemplo, tem emissão de gases de efeito estufa significativamente reduzido, mas os impactos ambientais podem ser bem maiores do que a gasolina se outros parâmetros forem considerados. “A produção de cana-de-açúcar usa muita água e ainda provoca a poluição dos rios próximos. Os fertilizantes nitrogenados usados abundantemente nas plantações, após serem quebrados em óxidos de nitrogênio, também vão afetar a camada de ozônio; e a prática da queimada, após a colheita, contribui para o aumento do efeito estufa.”

A soja usada no Brasil para produzir biodiesel pode ter um impacto ainda pior, segundo Laurance. “Além de ser produzida com a ajuda de fertilizantes com nitrogênio, essa cultura é a principal protagonista do desmatamento na Amazônia, o que a torna mais poluente que a própria gasolina em termos de gases que contribuem para o efeito estufa.”

Outro motivo de questionamentos é que a produção de combustível, seja de soja ou de cana, também causa aumento no custo dos alimentos, tanto de forma direta quanto indireta. Por exemplo , o preço do açúcar teve um aumento no mercado internacional porque muitos produtores brasileiros estão produzindo apenas álcool. Esse problema é agravado considerando que nos Estados Unidos o álcool é feito de milho e na Europa usa-se a beterraba e o trigo na produção de álcool. Evidentemente, se os governos passarem a incentivar os agricultores a tirar os grãos da produção de alimentos, destinando-os para a produção de biocombustíveis, e os investidores começarem a especular com grãos nos mercados financeiros, isso certamente colocará pressão sobre os preços de alimentos. Também não se pode permitir a derrubada de florestas e a drenagem de mangues, valiosos na absorção de CO 2 da atmosfera, a fim de abrir espaço para a produção de biocombustível, pois isso anularia os seus benefícios.

Não há dúvidas que o etanol brasileiro é sustentável e seu uso oferece vantagens sobre a gasolina, mas deve haver limites bem definidos. É essa a opinião dos cientistas que atuam na área. “Temos de pensar como produzir com menor impacto de emissão de gases, menor consumo de água, entre outros. Talvez tenhamos de repensar processos de adubação e reduzir a quantidade de calcário; pode ser possível reduzir a um limite tal que não comprometa a produção, mas que diminua consideravelmente a emissão de dióxido de carbono”, declara Carlos Clemente Cerri, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura, da Universidade de São Paulo (USP).

Enfim, não se pode simplesmente condenar a produção dos biocombustíveis, mas certamente pode-se exigir que haja mais seletividade nas estratégias de produção a fim de, no mínimo, diminuir os impactos socioambientais. É imperativa, também, a necessidade urgente do estabelecimento de certificados internacionais para os produtos feitos a partir de biomassa. Talvez algo nessa direção ocorra durante as negociações da segunda fase do Protocolo de Kyoto, no mês de dezembro deste ano, em Copenhagen (Dinamarca).

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